Argo


So when the first bold vessel dar'd the seas,
High on the stern the Thracian rais'd his strain
While Argo saw her kindred trees
Descend from Pelion to the main.
Transported demi-gods stood round. [i]
Ode on St. Cecilia's Day, de Pope.


ARGO NAVIS

frequentemente apenas Argo, — erroneamente Argus, da confusão com seu genitivo, — ou Navis, é a nossa Argonave, a Schiff dos alemães, Navire Argo dos franceses e Nave Argo entre os italianos.

Argo Navis, nas pranchas de Hevelius
Ela jaz inteiramente no hemisfério sul, a leste do Cão Maior, a sul do Unicórnio e da Hidra, em grande parte sobre a Via Láctea, cobrindo uma grande área do céu, tendo cerca de setenta e cinco graus de extensão, — Manílio chegou a chamá-la nobilis Argo, — e contendo 829 estrelas visíveis a olho nu.

Lacaille teve de usar 180 letras para anotar suas estrelas, muitas das quais duplicadas. O tamanho da constelação era tão desproporcional, que muitos astrônomos passaram a dividi-la em partes por conveniência ao referenciar a posição dos objetos celestes nela situados. Tal divisão acabou sendo acolhida em 1925 pela União Internacional Astronômica, de modo que atualmente se usa três constelações no lugar da primitiva Argonave: Carina, a Carena ou Quilha do navio; Puppis, a Popa; e Vela. Em inglês, essas novas constelações receberam os nomes Keel, Stern e Sail. Embora dividida, o conjunto continua a representar o navio dos argonautas.

Representação de Argo no Uranografia de Bayer, com as linhas das divisões modernas.
Além disso, Lacaille também compôs outros asterismos dentro das divisões maiores: Malus, o Mastro, e Pyxis Nautica, a Bússola do Navegante, conhecida entre os alemães como See Compass, na França como Boussole ou Compas de Mer, e entre os anglofalantes como Nautical Box ou Mariner's Compass; esta última subdivisão acabou também sendo acolhida pela União Astronômica Internacional, dando origem à moderna constelação da Bússola. Curiosamente, a posição da atual constelação da Bússola coincide com o que seria o mastro do navio, e não espanta que John Herschel tenha proposto que seu nome fosse mudado para Malus.

Com outras estrelas Bode formou a constelação Lochium Funis, sua Logleine, nossa Barquilha — um instrumento usado para medir a velocidade de uma embarcação —, que agora caiu em desuso.

O navio parece não ter uma proa, apresentando assim a mesma perspectiva secional visível no Pequeno Cavalo, Pégaso e Touro, e geralmente é mostrado assim nos mapas. Em referência a isto, Arato escreveu:

Junto ao Grande Cão, de popa avante Argo
Se apresenta; pois segue um curso distinto,
Levado para trás, como fazem os navios
Virados de popa à costa pelos nautas
Ao entrar no porto; todo o navio invertido,
Seguindo de ré atraca à praia. Assim é,
De popa avante, o navio de Jasão. [ii]

A perda de sua proa teria ocorrido

quando a Argo passou
Através do Bósforo entre as rochas que se entrechocam [iii]

as Simplégades, as Rochas Ciâneas (azuis) ou Flutuantes (Planctae) à entrada do Mar Euxino. Apesar disso, Arato a considerava completa, pois escreveu:

Toda a Argo se encontra acima no céu,

e
Parte se move sombria e sem estrelas, da proa
Até o mastro, mas todo o resto é brilhante; [iv]

e desta forma ela foi ilustrada e descrita por artistas e autores. As Tábuas Afonsinas mostram-na como uma embarcação completa de dois mastros munida de remos, e Lubienitzki, no Theatrum Cometicum de 1667, como uma carraca de três mastros com uma fileira de escotilhas e todas as velas cheias ao vento.

Argo, representada num globo de Mercator.
Mitologicamente, ela teria sido construída por Glauco, ou por Argos, para Jasão, líder dos cinquenta argonautas, cujo número se iguala ao de remos do navio, com o auxílio de Palas Atena, que colocou na proa um pedaço do carvalho sagrado de Dodona, ficando assim dotada com o poder de advertir e guiar os chefes que formavam sua tripulação. A embarcação levou a famosa expedição de Iolco, na Tessália, para Ea, na Cólquida, [1] em busca do velocino de ouro; e quando a viagem acabou, Atena colocou o barco no céu.

Outra tradição grega, segundo Eratóstenes, afirmava que nossa constelação representava o primeiro navio a navegar pelo oceano, o qual muito antes do tempo de Jasão levou Dânao com suas cinquenta filhas do Egito a Rodes e Argos, e, como escreveu Dante,

admirar fez Netuno a sombra de Argo. [v]

Lendas do Egito afirmam que ela era a arca que carregou Ísis e Osíris durante o dilúvio; enquanto os hindus achavam que ela tinha desempenhado o mesmo ofício a seus equivalentes Isi e Iswara. E sua tradição pré-histórica fez do navio Argha o seu sol errante, conduzido por Agastya, a estrela Canopus. Neste sânscrito argha talvez possamos ver a mesma denominação que lhe damos; mas Lindsay deriva Argo de arek, uma palavra semítica, usada pelos fenícios, significando “longa”, posto que esse teria sido a primeira embarcação realmente longa lançada ao mar.

Sir Isaac Newton devotou muita atenção a este famoso engenho e julgou que a data de sua construção teria sido 936 aC, quarenta e dois anos após sua datação para o reinado de Salomão.

Entre os romanos, ela sempre foi Argo e Navis, tendo Vitrúvio a nomeado Navis quae nominator Argo; mas Cícero a chamou de Argolica Navis e Argolica Puppis; Germânico, Argoa Puppis; Propércio, o poeta elegíaco do século I de nossa era, Iasonia Carina; Ovídio, Pagasaea Carina e Pagasaea Puppis, do porto tessaliano onde ela foi construída — i.e., em Pagasas; Manílio, Ratis Heroum, a Balsa dos Heróis,

que também agora navega, entre as estrelas; [vi]

e outros, Navis Jasonis ou Osiridis (Navio de Jasão ou de Osíris), Celox Jasonis (Bergantim de Jasão), Carina Argoa, Argo Ratis, e Navigium Praedatorium, o Navio Pirata. E um tanto semelhante a essas eram, Ἅρμα Θαλάσσης e Currus Maris, ambas com o significado de Carruagem dos Mares, e a Currus Volitans (Carruagem Alada) de Catulo, que afirmou ter sido ela chamada de Vehiculum Lunae (Veículo da Lua) no Egito.

Ela era também o Equus Neptunius (Cavalo do Netuno); e de fato Ptolomeu assegura que ela era conhecida como o Cavalo pelos habitantes da Azânia, a moderna Ajan, na costa nordeste da África, a sul do cabo Gardafui.

A constelação al-Safīnah (Navio), no Descrição das Estrelas Fixas, de al-Ṣūfī.
Os arábios chamavam-na de al-Safīnah, o Navio, e Markab, a Embarcação,[vii] que quatro ou cinco séculos atrás na Europa foram transcritas como Alsephina e Merkeb.

Grotius mencionou Cautel como uma denominação para Puppis, “segundo as Tábuas”, mas ele anotou em seguida Hoc quid sit nescio.[viii]

Arca de Noé, uma das representações
já usadas para esta constelação.
A escola bíblica, é claro, chamava-a de Arca de Noé, a Arca Noachi ou Archa Noae como escreveu Bayer. Jacob Bryant, o mitologista inglês do século XVIII, chegou a recontar o mito de Jasão como se fosse uma versão daquele de Noé.[ix] De fato, no século XVII, Ark (Arca) parece ter sido um nome popular para esta constelação.[x]

Em History and Chronology of the Myth-Making Age de James F. K. Hewitt, encontramos referência às “quatro estrelas que marcam os quadrantes dos céus no Zendavesta, que também são as quatro Lokapālas, ou nutridoras do mundo, dos hindus”;[xi] e tal autor atribui a elas: Sirius no leste, as sete estrelas da Grande Ursa no norte, Corvo no oeste e Argo no sul. Ele deu a esta última o título de Satavaēsa, os Cem Criadores; todos imaginados como se formassem uma grande cruz no céu. A diferente concepção que os persas tinham sobre isso é mencionada adiante nos comentários sobre Regulus, — α Leonis.[xii]

Dada a dimensão da constelação, vários asterismos chineses foram formados de suas partes: Tiān Miào (Templo do Céu), Hǎi Shí (Rocha do Mar), Hú Shī (Arco e Flecha) e Tiān Gǒu (Cão Celestial).

A constelação é perceptível em baixas latitudes não somente por sua grande extensão e esplendor de Canopus, mas também por possuir a impressionante variável η e sua circundante nebulosa.

Próximo à estrela z1 Carinae surgiu, entre 5 de março e 8 de abril de 1895, uma nova.



(...) like a meadow which no scythe has shaven,
Which rain could never bend or whirl-blast shake,
With the Antarctic constellations paven,
Canopus and his crew, lay the Austral lake. [xiii]
The Witch of Atlas de Percy Bysshe Shelley

α Carinae, −0.4, branca

O nome Κάνωβος, na antiga ortografia dos gregos, aparentemente foi pela primeira vez atribuído a esta estrela por Eratóstenes; mas Κάνωπος, posteriormente, por Hiparco. Ptolomeu usou o primeiro, entre seus poucos nomes estelares, o qual Halley e Flamsteed transcreveram como Canobus; mas atualmente ela é universalmente conhecida como Canopus, adaptada ao árabe como Kanupus segundo o tradutor de al-Ṣūfī. Em Português, também é ocasionalmente denominada com as variantes Canopo ou Canopeia.

Arato, Eudoxo e Hiparco também designaram-na como Πηδάλιον, o Leme, o Gubernaculum de Cícero. Sobre isso, Arato escreveu:

O leme afrouxado foi colocado sob
As patas traseiras do Cão. [xiv]

Navios antigos tinham um leme de cada lado da popa, em um dos quais essa estrela geralmente era representada, diferindo assim dos mapas modernos que a localizam no banco de remos.

Estrabão, o geógrafo do século I aC, afirmou que seu nome vinha de “pouco tempo atrás”, o que pode ser real quanto à palavra que atualmente conhecemos; mas o sacerdote poeta egípcio do tempo de Tutmés III — 1500 anos antes de Estrabão — chamava-a de Karbana,

a estrela
Que derrama sua luz em um relance de fogo,
Quando ele dispersa o orvalho da manhã [xv]

e este ainda é encontrado um milênio depois no Kabarnit dos dias de Assurbanipal.[xvi]

O nome que lhe damos vem do nome do timoneiro da frota de Menelau. Segundo Cílax de Carianda, ao retornar da Queda de Tróia, em 1183 aC, Canopo teria aportado no Egito, doze milhas a nordeste de Alexandria, onde veio a falecer e foi homenageado por um monumento erguido por seu agradecido mestre, dando-lhe o nome à cidade [2] e a essa esplêndida estrela que, àquela época, erguia-se 7½° acima do horizonte.

Essa etimologia da palavra Canopus é antiga e popular; mas outra, talvez tão antiga quanto, e mais provável, sustentada pela autoridade de Aristides, indica o nome copta, ou egípcio, Kahi Hub, Terra Dourada. Ideler, concordando com isto, afirmou que essas palavras também eram a fonte de outras denominações de Canopus: os nomes árabes Wazn, Peso, e Ḥaḍār, Terra ou “Junto à Terra”; bem como de seus títulos ocasionais posteriores Ponderosus e Terrestris. Embora não tenhamos encontrado o motivo claro da adequação desses nomes, é fácil inferir que eles podem vir da magnitude da estrela e sua proximidade com o horizonte; este último certamente motivou o epíteto περίγειος usado por Eratóstenes. Talvez daí venha também seu epíteto τὸν Ἔσχατον τοῶ Ποταμοῶ — a que se se encontra mais remotamente na corrente —, usado por Higino (apud Bayer).

Similarmente, seu nome árabe mais comum era Suhayl, escrito nas nações do Ocidente como Suhail, Suhel, Suhil, Suhilon, Sohayl, Sohel, Sohil, Soheil, Sahil, Sihel e Sihil; todos derivados, segundo Buttmann, de al-Sahl, a Planície.

Essa palavra também servia como um título pessoal na Arábia e, diz Delitzsch, o símbolo do que é brilhante, glorioso e belo, e mesmo recentemente, entre os nômades, é usada para indicar uma pessoa bonita. Nossa própria palavra Canopus aparentemente teve um uso um pouco semelhante entre os primeiros escritores; pois Eden traduziu assim parte da narrativa da terceira viagem de Vespúcio em Of the Pole Antartike and the Starres abowt the Same:

Amonge other, I sawe three starres cauled Canopi, wherof two were exceadynge cleare, and the thyrde sumwhat darke;

e novamente, após descrever as “foure starres abowte the pole”:

When these are hydden, there is scene on the lefte syde a bryght Canopus of three starres of notable greatnesse, which beinge in the myddest of heaven representeth this figure ⁑⁎ ;

e outras frases similares com referência às Nubeculae; pois é sobre as Nuvens de Magalhães que os Canopus de Vespúcio parecem se referir em grande parte de sua descrição. Mas não se sabe por que motivo ele usou essa denominação, e a fama de Vespúcio certamente não se assenta sobre seu conhecimento dos céus. O New English Dictionary citou de forma errada algumas dessas frases como se fossem referências a nossa α Carinae, estranhamente ignorando esse distinto uso diferente do título da estrela.

Entre os persas, Suhayl é sinônimo de sabedoria, como é visto no famoso livro Anwār i Suhaili, as Luzes de Canopus.[xvii]

Uma nota ao Cosmos de Humbold informa que este nome foi dado a outras estrelas em Argo, e Hyde assegura o mesmo quanto a seu uso para estrelas de constelações vizinhas. Ele registrou os nomes Suhel Alfard, Suhel Aldabaran e Suhel Sirius; de fato, segundo Carsten Niebuhr,[3] esta última estrela era comumente conhecida assim na Arábia há uns duzentos anos ou mais.

As Tábuas Afonsinas traziam Suhel ponderosus, que apareceu numa crônica contemporânea como Sihil ponderosa, uma tradução de Suhayl al-Wazn. No Almagesto de 1515, ela era Subhel; e nas Tábuas Greco-Persas de Chrysococcas (o escritor, físico e astrônomo grego do século XIV residente na Pérsia), editadas por Bullialdus em sua Astronomia Philolaica, ela era Σοαὶλ Ιαμανῆ. Este título vem do árabe Suhayl al-Yamaniyyah, o Suhail do Sul, ou talvez uma alusão à antiga estória, contada em conexão com Procyon, que Suhayl, inicialmente estava próximo às estrelas de Órion, tomada como um o asterismo feminino de nome al-Jawzāʾ; Suhayl teria fugido para o Sul após casar-se com al-Jawzāʾ, e lá ele permanece. Outros contam que Suhail só tentara cortejar al-Jawzāʾ, a qual não apenas o recusou, mas também muito sencerimoniosamente expulsou-o para os céus do sul.

Outro de seus títulos ocasionais era al-Faḥl, o Camelo Garanhão. Alusões a ela em todas as épocas indicam que, por toda parte, era uma estrela importante, especialmente no deserto. Neste, ela tinha muito prestígio, dando origem a muitos dos provérbios dos árabes, suas histórias e superstições, e era supostamente tida como responsável por conceder uma cor muito apreciada às suas pedras preciosas, bem como imunidade contra doenças. Seu nascer helíaco, até hoje usado no cômputo do ano deles, amadurecia os frutos e encerrava a temporada quente do verão, definindo o tempo para o desmame dos jovens camelos, o que foi aludido por Thomas Moore em sua Evenings in Greece:

Dorme um camelo — jovem, como desmamado
Quando Canopus nasce pela última vez. [xviii]

E, de modo geral, servia-lhes como uma estrela polar austral.

Ela era adorada pela tribo dos Tayy, como provavelmente ainda o deva ser entre alguns beduínos; e com respeito a isso, Carlyle escreveu em sua obra Heroes and Hero Worship:

Canopus reluzindo sobre o deserto, com seu brilho de diamante azul (aquele brilho selvagem, azul, semelhante a um espírito, muito mais brilhante do que jamais testemunhamos aqui), penetraria o coração do primitivo homem ismaelita, a quem estava guiando através daquela solitária aridez. Para seu coração inculto, com todos os sentimentos em si e sem termos para esprimir nenhum deles, bem poderia parecer um pequeno olho, aquela Canopus, observando-o da grande e profunda Eternidade; revelando-lhe seu esplendor interno.

Não podemos assim entender como esses homens adoravam Canopus; tornaram-se o que chamamos de sabeus, que adoravam as estrelas?...

Para nós também, através de cada estrela, através de cada folha de grama, um Deus não se torna visível, se abrirmos nossas mentes e olhos?

Nós não adoramos desse modo atualmente: mas não é ainda considerado um mérito, prova do que chamamos de “natureza poética”, que reconheçamos como cada objeto tem uma beleza divina; como todo objeto ainda é, na verdade, “uma janela através da qual podemos examinar a própria Infinitude”?


Thomas Moore escreveu sobre isso em Lalla Rookh:

The Star of Egypt, whose proud light,
Never hath beam'd on those who rest
In the White Islands of the West; [xix]

e aludiu novamente a isso, no mesmo poema, como a causa da infalível alegria dos habitantes de Zinge.[xx] E como a constelação foi associada ao grande deus Osíris na região do Nilo, sua estrela mais brilhante tornou-se a Estrela de Osíris; mas, posteriormente, Marciano Capela e o escoliasta em Germânico chamaram-na de Ptolemaeon e Ptolemaeus, em honra ao grande faraó Ptolomeu Lagos [xxi] do Egito; e por vezes ela foi chamada de Subilon, mas a veracidade desta informação não nos foi possível confirmar. O Σάμπιλος, citado por Hyde como proveniente de Kircher, e portanto presumivelmente Copta, é igualmente ininteligível.

Todo esse conhecimento sobre Canopus é antigo, mas parece “relativamente recente” quando consideramos a histórica veneração da estrela na região do Nilo. Lockyer conta-nos sobre uma série de templos em Edfu, Filas, Amada e Semna, orientados por construção, em 6400 aC, para mostrar Canopus a preceder o nascer do Sol no equinócio de outono, quando ela era conhecida como o símbolo de Khons, ou Khonsu, o primeiro deus-estrela do Sul; e sobre outros templos similares mais tardios. Ao menos duas das grandes estruturas em Carnaque, datadas de 2100 e 1700 aC, respectivamente, apontavam para seu pôr; como também o fazia outra em Naga e o templo de Khons em Tebas, erigido por Ramsés III por volta de 1300 aC, posteriormente restaurado e ampliado pela dinastia ptolomaica. Portanto, ela provavelmente era o objeto proeminente na religião do Sul do Egito, onde representava o deus das águas.

Alguns dos rabinos asseguraram — bem como Delitzsch séculos depois — que esta estrela, e não Órion, era o Kesil da Bíblia,[xxii] argumentando com base na similaridade do som dessa palavra com o Suhayl da Arábia, e noutras razões explicadas longamente, embora não aceitas, por Ideler; por outro lado, coincidentemente, há competentes comentaristas que supõem que o termo “Kesilim” de Isaías 13:10, atualmente traduzido como “Constelações”, signifique as estrelas mais brilhantes, as quais frequentemente são aquelas referenciadas pelo uso da palavra Suhail. Delitzsch, em seus comentários ao Livro de Jó, usa muitas citações, de Wetzstein e outros, acerca dessa associação de Canopus com Kesil, ilustrando-a com estórias e provérbios estelares dos árabes de Hauran, o lar tradicional do patriarca.[xxiii]

Os hindus chamavam-na de Agastya, um dos seus Rishis, ou sábios inspirados, — e timoneiro da Argha, — um filho de Varuna, a deusa das águas; e a literatura sânscrita possui muitas alusões ao seu nascer helíaco em conexão com certas cerimônias religiosas. No Avesta, menciona-se que essa estrela “empurra as águas avante” — o que poderíamos talvez interpretar como se tivesse o poder de governar as marés?

O assiriologista George Bertin identificou-a com Sugi, o Jugo da Carruagem Eufrateana; mas outros reivindicam este título para algumas estrelas do zodíaco, ainda indeterminadas, mas provavelmente as lúcidas de Libra.

Na China, ela é Lǎorén Xīng (Estrela do Ancião) ou Nánjí Lǎorén (Ancião do Polo Sul), e era objeto de adoração desde pelo menos o ano 100 aC.

Desde o século VI, ela é a Estrela de Santa Catarina, que surgia no céu aos devotados peregrinos gregos e russos à medida que eles se aproximavam de seu monastério e santuário no Sinai, em seu caminho desde Gaza, onde aportavam.

Nos primeiros livros alemães de astronomia, ela era a Schifstern, ou Estrela do Navio.

Juntamente com Achernar e Fomalhaut, estrelas correspondentes em Erídano e no Peixe Austral, ela compunha as Tre Facelle (Três Lumes) do Purgatório de Dante, simbolizando Fé, Esperança e Caridade, —

três astros luminosos,
Que o pólo acendem, célicos portentos.[xxiv]

Hiparco costumava observá-la de Rodes, situada à latitude 36°30′; e, mesmo antes dele, Posidônio de Alexandria,[4] por volta de meados do século III antes de Cristo, utilizou-a num experimento para medir um grau na superfície da Terra, ao longo da linha entre essa cidade e Rodes, realizando suas observações a partir da antiga torre de observação de Eudoxo em Cnido, na Cária, — o que, possivelmente, foi a mais antiga tentativa de medição geodésica, pois esse observatório foi o primeiro a ser mencionado na Era Clássica. Manílio poeticamente seguiu seu caminho, usando-a com a Ursa, para provar a esfericidade da Terra.

A confusão entre os títulos dados a Canopus e à Cabeleira de Berenice estão anotados adiante, sob a seção dedicada a esta última.

Situada 52°38′ a sul do equador celeste, cerca de 35° abaixo da declinação de Sirius, esta estrela não é visível a observadores situados a norte do paralelo 37°.

Assim como outras estrelas luminosas, Canopus tinha grande importância para os polinésios, que delas dependiam para guiar-se na navegação através das ilhas. Para eles, Canopus, Sirius e Procyon formavam a constelação conhecida como Manu, que representava um grande pássaro que dividia seu firmamento em dois hemisférios. Já os havaianos a chamavam Ke Alii-o-kona-i-ka-lewa (Chefe da Vastidão do Sul).

Os maoris consideravam-na importante em seus rituais que usavam para ela vários nomes: Ariki (Nobre), Atutahi e Kauanga, ambas palavras com sentido de “solitária”, posto parecer situar-se fora da via láctea. Ela servia-lhes como anunciadora do período de plantio da batata doce, bem como para a previsão do tempo.

Já para os kalapalo, do Mato Grosso, ela anunciava o início do período chuvoso e da colheita da mandioca, formando com Procyon e outras estrelas a constelação Kofongo (Pato).

Canopus é tão luminosa que observadores no Chile, em 1861, consideraram-na mais brilhante que Sirius; e Tennyson, em seu poema Dream of Fair Women, usou-a para ilustrar uma comparação com a mais intensa luz, — nas palavras de Cleopatra: —

lâmpadas que ofuscariam Canopus. [xxv]

Ainda assim, Elkin obsteve-lhe uma paralaxe de apenas 0".03, — praticamente nula — indicando que ela se encontra a uma distância pelo menos doze vezes maior ao nosso sistema do que sua rival em brilho.

Em 1897, See descobriu uma companheira azulada de magnitude 15, distante 30" a um ângulo de posição de 160°.

β, 2.

Miaplacidus é escrita desta forma no Geography de Burritt, de 1856, mas figura como Maiaplacidus em seu Atlas de 1835, cujos significado e derivação são obscuros, ao menos em parte, pois Higgins asseverou que se trata de um hibridismo formado por Miyāh, plural do árabe Māʾ, Água, com o latim Placidus, tendo o significado geral de “Águas Calmas”. A origem desse hibridismo é ainda desconhecida.

β situa-se na subdivisão Carina e corresponde à α da constelação desusada Robur Carolinum (Carvalho de Carlos) proposta por Halley, a 25° a leste de Canopus e a 61° ao sul de Alphard, na Hidra. Mas curiosamente, esta β não corresponde àquela anotada por Bayer em sua Uranographia; na verdade, já no começo do século XVIII, Baily reportou essa inconsistência: Bayer anotou sua β numa posição que não corresponde a qualquer estrela de tal magnitude.
Argo Navis no mapa celeste desenhado por Corbinianus Thomas (1730).
Note o Carvalho de Carlos representado à direita e ao Sul do Navio.
Juntamente com θ, ω e outras estrelas mais débeis, ela formava o asterismo chinês Nán Chuán (Embarcação do Sul).

γ, 2,

era chamada, entre os árabes, Suhayl al-Muḥlif, a Suhail do Jurado, e com ζ e λ formava um dos diversos grupos conhecidos como al-Muḥlifayn, Muḥtalifayn ou Muḥnithayn — podendo ser os dois primeiros termos traduzidos genericamente como “o Júri”, enquanto o terceiro aparenta ser uma corruptela desses —, por meio dos quais se fez referências à afirmação de que, ao nascerem, alguns as confundiam com Suhail, e as disputas decorrentes disso eram motivo de muita profanidade entre os contendores árabes. Como, no entanto, parece impossível que Canopus pudesse ser confundida com qualquer estrela vizinha, essa derivação é tão absurda quanto é duvidosa a localização exata do Muḥlifayn, pois foram identificados não apenas a esta estrela, mas também a estrelas do Cão Maior, do Centauro e da Pomba.

γ jaz na subdivisão Vela, e é visível de todos os pontos da Terra situados ao sul da latitude +42°. Tal como β, foi incorretamente marcada na Uranometria, e Baily foi quem primeiro relatou que não era capaz de encontrar a γ de Bayer no céu.

Na China, ela compunha com δ, κ e b Velorum o asterismo Tiān Shè (Templo Celestial do Deus da Terra); mas outra tradição chinesa incorporava-a ao asterismo Hú Shǐ, o Arco e Flecha.

Em listas estelares modernas, ela por vezes figura com o nome Regor, da inversão do prenome do astronauta americano Roger Chaffee, devido a uma suposta brincadeira de um de seus colegas da Apollo 1.

Esta é a única estrela conspícua que apresenta o tipo Wolf-Rayet de um espectro contínuo cruzado por linhas brilhantes. Eddie a chamou de Gema Espectral dos Céus Austrais.

Mais apropriadamente, γ Velorum é um sistema quádruplo. Suas duas estrelas principais estão separadas por 41ʺ, cada uma das quais é também uma binária espectroscópica. A mais brilhante delas, γ2, é composta pela estrela Wolf-Rayet e uma supergigante azul, enquanto γ1 contém uma gigante azul e um companheiro invisível.

δ, 2.2,

é Alsephina, do árabe al-Safīnah, o Navio, nome inicialmente usado para toda a constelação, mas posteriormente atribuído apenas a δ pelo menos desde 1660, quando Cellarius assim a listou em seu Harmonia Macrocosmica.

Como mencionado no texto sobre γ, ela integrava de dois asterismos chineses. O maior destes, Hú Shǐ, (Arco e Flecha), incluía ω e estrelas do Cão Maior.

Junto com ε, ι e κ, ela compõe a célebre Falsa Cruz, o asterismo austral frequentemente confundido com o Cruzeiro do Sul.

ε, 1.8,

foi oficialmente batizada como Avior, pela União Astronômica Internacional, em 2016. Embora este nome à primeira vista pareça ter etimologia clássica, ele foi inventado pelo Her Majesty's Nautical Almanac Office por volta de 1937, por exigência da Força Aérea Britânica que insistia em que todas as estrelas listadas em seu almanaque usado para navegação astronômica tivessem nome próprio.

ζ, 2.5,

na Popa, é Naos, do grego ναύς (Navio), já assim mencionada no Atlas de Burrit. Ela está na extremidade sudeste do X Egípcio, um asterismo formado por esta estrela, Procyon, Betelgeuse e Phaet, cujos alinhamentos se cruzam em Sirius.

Al-Sufi a denominou Suhayl Hadār, que tem o possível significado de “a ruidosamente brilhante”; já com γ e λ, formava um dos Muḥlifayn.

Os chineses a incorporaram ao asterismo Hǎi Shí (Rocha do Mar), juntamente com ι, υ e outras duas estrelas mais débeis.

η, variável irregular, > 1 até 7.4, avermelhada,

jaz na subdivisão Carina, sendo amplamente conhecida entre amadores e profissionais por sua designação na nomenclatura de Bayer: Eta Carinae, embora ao longo dos séculos tenha tido outras nessa mesma nomenclatura: Eta Argus, Eta Navis e Eta Roboris Caroli, esta última por figurar na constelação desusada criada por Halley.

Eta Carinae (Crédito: J. Hester/Arizona state University, NASA/ESA)

Este é um dos objetos mais notáveis nos céus, talvez desde tempos quase pré-históricos, pois as inscrições babilônicas parecem referir-se a uma estrela que ocasionalmente apresentava uma fraqueza ocasional em sua luz, a qual Peter Jensen acreditou ser η. E ele também a identificou como uma das estrelas do templo associadas a Ea, ou Ia, de Eridhu, [5] o Senhor das Ondas, também conhecido como Oannes,[6] o misterioso peixe humano e maior divindade do reino.[xxvi]

Em listas modernas, ela figura com dois nomes não oficiais: Foramen e Tseen She. Inexplicavelmente, o primeiro destes não possui etimologia nessas mesmas listas, mas sua coincidência com a palavra latina “foramen” (abertura, buraco) sugere que seja esta sua origem, mesmo porque η situa-se próxima à uma das aberturas de remos na representação clássica do navio Argo. Já o segundo é uma transliteração imperfeita do chinês Tiān Shè, antigo asterismo em cuja proximidade η é encontrada, mas do qual ela provavelmente não fazia parte.

Após o século XVII, os chineses que mapearam o céu austral incluíram-na no novo asterismo Hǎi Shān, Mar e Montanha.

As variações de sua luz são tão notáveis em irregularidade quanto em intensidade. As primeiras observações registradas datam de 1677, por Halley, e embora ela não figure em seu Southern Catalogue, caracterizaram η como uma estrela de 4.a magnitude, mas, desde então, ela tem variado muitas vezes, em intervalos maiores ou menores, desde a invisibilidade absoluta a olho nu até um brilho quase comparável ao Sirius. Sir John Herschel notou-o em dezembro de 1837, como outros o fizeram em 1843 — fenômeno atualmente conhecido como a Grande Erupção; mas, declinando gradualmente desde então, atingiu um mínimo de magnitude 7.6 em 1911. Agora está, no entanto, aumentando, e apresenta a magnitude 4.3 em 2018.

É digno de nota que os Boorong da Australia contam sobre o aparecimento no céu duma estrela avermelhada que eles chamaram Collowgulloric War, a Esposa de War (seu nome para Canopus). Em 2010, os astrônomos australianos Duane Hamacher e David Frew argumentaram que esta estrela seria Eta Carinae durante sua Grande Erupção na década de 1830-40.

Eta Carinae, na verdade, é um par binário formado por duas estrelas de grande massa. A proximidade entre as estrelas provoca diversos fenômenos de ejeção de massa e interação, ocasionando a intensa variabilidade, que foi desvendada em 1997 pelo astrônomo brasileiro Augusto Damineli. O material ejetado pela estrela primária durante a Grande Erupção forma uma estrutura bipolar que circunda as estrelas e que recebeu o nome de Nebulosa do Homúnculo.

O par binário faz parte de uma nebulosa ainda maior, NGC 3372, chamada de Keyhole (Buraco de Fechadura) devido à sua aparência; mas sua porção mais brilhante, tal como desenhada por Sir John Herschel, parece ter desaparecido durante algum tempo entre 1837 e 1871. Este grande observador viu 1203 estrelas espalhadas sobre a superfície da nebulosa.

Em meio à nebulosa, próximo a η, há um espaço vago de tamanho irregular, que Francis Abbott chamou de Crooked Billet;[xxvii] e há dois notáveis aglomerados em sua imediata vizinhança.

Os Eta Carinídeos são uma fraca chuva de meteoros que possui radiante próximo a η. Seu máximo é observado em torno de 21 de janeiro.

ι, 2.9, amarelo pálida.

Era Scutulum, o Pequeno Escudo, entre os romanos, e Turais entre os arábios, de mesmo significado, provavelmente em referência ao aplustre ornamental à proa do navio na subdivisão Carina; mas Hyde, apontando-a como Turyeish em al-Tizīnī, afirmou que o termo original era verbum ignotum, e sugeriu que alguém mais conjeturasse sobre isso e seu significado. Smyth escreveu que ela “correspondia a Ἀσπιδίσκε de Ptolomeu” (que provém do diminutivo de Ἀσπίδα, Escudo); mas este descreveu-a como estando situada no Ἀκροστόλιον, i.e., na borda do costado, e situou κ, ξ, ο, π, ρ, σ e τ no Ἀσπιδίσκε, ou aplustre, onde elas atualmente são representadas. O Century Atlas acompanhou Smyth ao chamá-la de Aspidiske, e tal nome foi finalmente oficializado para ι em 2016, por decisão do WGSN da União Astronômica Internacional.

κ, 3.9,

é Markeb, do árabe Markab que significa “algo sobre o qual se monta ou que se conduz” (no caso, a embarcação), por determinação do WGSN da União Astronômica Internacional em 2017. Mas historicamente sua grafia oscilou entre este e Markab, com preferência para o primeiro, para diferenciá-la de outras estrelas de nome similar, como α Pegasi. Este nome parece vir das Tábuas Afonsinas de 1521, que explicitamente usou Markeb como seu nome próprio.

λ, 2.5,

na Vela, é Suhail, nome aprovado em 2017 pelo WGSN da União Astronômica Internacional, proveniente de seu antigo nome Suhayl al-Wazn, Suhail do Peso, relatado por al-Ṣūfī. No passado, o nome Suhayl era comumente usado para várias estrelas brilhantes, embora fosse próprio a Canopus; e, com γ e ζ, compunha um dos Muḥlifayn. Entre os chineses, era chamada de Tiān Jì, o Juiz para Estimar a Idade dos Animais.[xxviii]

π, 2.7, figura em listas modernas com o nome não oficial Ahadi, supostamente significando “que tem muito compromisso”, talvez do árabe ʿAhd, Compromisso. Não há informações adicionais sobre quando esse nome passou a estar associado à estrela, e é estranho que não haja registro dele nas tradicionais listas árabes.

ρ, 2.7, recebeu o nome Tureis do WGSN da União Astronômica Internacional em 2016, do árabe Turais, Pequeno Escudo, denominação antiga usada para ι Carinae. De fato, ρ encontra-se muito mais próxima do Ἀσπιδίσκε da figura estelar do que ι, tal como Ptolomeu assinalou.

ξ, 3.4, era conhecida como Asmidiske ou Azmidiske, uma transliteração incorreta de Ἀσπιδίσκε, onde ela se situa com a estrela ι. Desde 2018, contudo, seu nome oficial passou a ser Azmidi, determinado pelo WGSN da União Astronômica Internacional, pelo encurtamento do antigo nome, de modo a evitar confusão com Aspidiske.

ψ, 3.7, na Vela, foi apresentada por Reeves como Tseen Ke, com a tradução: “o Registro Celestial”. Esse nome é, na verdade, uma transcrição antiga de Tiān Jì, asterismo marcado por λ.

Além da Falsa Cruz, uma segunda cruz aparente, a chamada Cruz Diamante, se encontra ao sul de Carina, composta pelas estrelas β, θ, υ e ω. Igualmente, a Cruz Diamante costuma ser confundida com o Cruzeiro do Sul.

Grotius mencionou Alphart como o título de alguma estrela do Navio, embora sem localizá-la, e muito corretamente aditou sed hoc ad lucidam Hydrae pertinet; mas como o topo do Mastro em alguns mapas fica muito próximo desta lúcida, Alphard, a explicação parece óbvia.

Baily afirmou que a estrela 13 Argus na tabela de Flamsteed, estranhamente posicionada a 20° de Argo em direção ao Unicórnio, deveria ser a 15 Canis Minoris de Flamsteed.

De estrelas de Argo, situadas por trás das costas do Cão Maior, Bartschius formou a pequena constelação do Gallus, o Galo, já há muito tempo esquecida.


Notas de Rodapé (do texto original)


[1] A Cólquida era uma localidade situada na costa oriental do Mar Euxino, posteriormente conhecida como Mingrélia e, atualmente, parte da Geórgia.
[2] A antiga Canopo atualmente se encontra em ruínas, mas seu sítio foi ocupado pelo vilarejo Abuquir, ou Abu Qīr, famoso em função da Batalha do Nilo onde atuou o almirante Nelson, em 1 de agosto de 1798, e pela vitória de Napoleão sobre os turcos no ano seguinte; e é interessante lembrar que foi aí, no terraço murado do Serapeu, o templo de Serápis, que Ptolomeu fez suas observações. Serápis era o título do grande Osíris do Egito como deus do mundo inferior; sua encarnação como deus do mundo superior correspondia ao touro Ápis.
[3] Este Niebuhr foi o famoso viajante alemão que seguiu a serviço da Dinamarca para o Oriente entre 1761 e 1767, pai do grande historiador Barthold Georg Niebuhr. Suas descobertas em Persépolis deram a pista para a decifração de inscrições cuneiformes.
[4] Este Posidônio não deve ser confundido com o filósofo estóico contemporâneo de Cícero, embora o próprio estóico fosse um astrônomo e, como já foi dito, o inventor do planetário.
[5] Eridhu, ou Eri-duga, a Cidade Santa, Nunki ou Nunpe, uma das cidades mais antigas do mundo, mesmo na antiga Babilônia, era o florescente porto daquele reino no Golfo Pérsico, mas, pelo assoreamento e tomada do delta do rio, seu sítio agora se encontra a cem milhas para o interior. Em sua vizinhança, os babilônios situavam sua sagrada Árvore da Vida.
[6] Berōssōs descreveu Oannes como o professor do homem primitivo em todos os conhecimentos; e na mitologia ele era até mesmo o criador do homem e o pai de Tammuz e Ishtar, eles próprios associados a outras estrelas e figuras celestes. Jensen achou que Oannes estava conectado com as estrelas de Capricórnio; Lockyer encontrou sua contrapartida no deus Chnemu do sul do Egito; e alguns o consideraram como o protótipo de Noé.


Notas Explicativas da Tradução


[i] Versos 38-42 do poema Ode on St. Cecilia's Day de Alexander Pope. Em tradução livre: “E quando o primeiro ousado navio desafiou os mares, / No alto da popa, o trácio elevou sua tensão. / Enquanto Argo via árvores como as suas / Descer de Pelião para o alto-mar. / Semideuses transportados estavam ao redor”.
[ii] Tradução livre a partir da tradução do texto grego ao Inglês feita por Robert Brown Jr., quotada por Allen: “Sternforward Argō by the Great Dog's tail / Is drawn ; for hers is not a usual course, / But backward turned she comes, as vessels do / When sailors have transposed the crooked stern / On entering harbour ; all the ship reverse, / And gliding backward on the beach it grounds. / Sternforward thus is Jason's Argo drawn”. Compare com a tradução de A. W. & G. R. Mair, de 1921: “Beside the tail of the Great Dog the ship Argo is hauled stern-foremost. For not hers is the proper course of a ship in motion, but she is borne backwards, reversed even as real ships, when already the sailors turn the stern to the land as they enter the haven, and every one back-paddles the ship, but she rushing sternward lays hold of the shore. Even so is the Argo of Jason borne along stern-foremost”.
[iii] Tradução de trecho dos versos 1017-1018 do Canto II de Paraíso Perdido, de Milton. No original: “when Argo passed / Through Bosporus betwixt the justling rocks”. A tradução ao Português feita por António José de Lima Leitão modifica ligeiramente o verso, em busca da métrica: “entre as cruas penhas / que erriçam longe o Bósforo medonho, / a nau Argo vogou!
[iv] Tradução livre a partir da tradução do texto grego ao inglês feita por Robert Brown Jr., quotada por Allen: “Part moves dim and starless from the prow / Up to the mast, but all the rest is bright”. Compare com a tradução de A. W. & G. R. Mair, de 1921: “Partly in mist is she borne along, and starless from her prow even to the mast, but the hull is wholly wreathed in light”.
[v] Tradução do v. 96 do Canto XXXIII do Paraíso em A Divina Comédia, de Dante, por José Pedro Xavier Pinheiro. No original em Italiano: “che fé Nettuno ammirar l'ombra d'Argo”. Allen quota esse verso como “Startled Neptune with the aid of Argo”.
[vi] Trecho do v. 13, Livro V, do Astronomicon de Manílio, na tradução de Marcelo Vieira Fernandes. No original latino: “quae nunc quoque navigat astris”. Allen quota esse verso como: “which now midst Stars doth sail”.
[vii] A palavra tem significado original de “local onde se controla qualquer coisa usada para transporte”, e pode significar tanto sela quanto um navio. Não é por acaso que a mesma palavra árabe denomina uma estrela de Pégaso, nesse caso com o sentido de sela.
[viii] A nota original de Grotius em seus comentários a Arato é: “In iisdem tabulis puppis Cautel vocatur. Hoc quid sit, nescio” (Nestas mesmas tábuas, Puppis é chamada de Cautel. O que vem a ser isso, desconheço).
[ix] Em seus livros, Jacob Bryant buscou mostrar que todos os mitos pagãos eram narrativas corrompidas originárias do Gênesis. Em A New System or an Analysis of Ancient Mythology, vol. 3, ele escreveu: “A Argo, no entanto, aquele navio sagrado, que teria sido elaborado segundo a sabedoria divina, encontra-se aí; e certamente não era outro senão a Arca. Os gregos supuseram que ele teria sido construído em Pagasas na Tessália, e dali navegara para Cólquida. Vou mencionar a seguir a improbabilidade desta história: deve se atentar que este mesmo porto, onde o navio foi construído, erachamado o Porto de Deucalião. Isso por si só seria uma pista forte de que na história do lugar há uma referência ao Dilúvio. Os gregos traziam a si cada antigo registro da História, transformando o seu país em palco de cada ação. O povo da Tessália sustentou que Deucalião fora exposto a uma inundação em seu distrit, e salvou-se no monte Atos; o povo da Fócida diz que ele foi para o Parnaso; já os dórios na Sicília alegavam que se tratava do monte Etna. Por fim, os habitantes do Épiro supunham que ele tenha escapado para seu país, onde fundou o antigo templo de Dodona. Em consequência disto, eles também reivindicaram a sua história. No que diz respeito à Argo, era o mesmo navio de Noé, do qual os baris do Egipto também eram uma representação. Ela foi chamada por Plutarco de navio de Osíris, que, como já mencionei, foi exposto numa arca para evitar a fúria de Tifão (...). 'O navio na esfera celeste, que os gregos chamam de Argo, é uma representação do navio de Osíris, o qual em reverência foi colocado nos céus'. O original, portanto, deve ser buscado no Egito. O próprio nome da Argo mostra o que é aludido; pois Argus significa precisamente uma arca (...)”.
[x] Parece ter contribuído para essa ideia a associação sonora entre as palavras Argo e Arca.
[xi] O termo lokapāla, que significa tanto em Sânscrito quanto em Páli “guardião do mundo”, possui diferentes usos a depender no hinduísmo e no budismo. No Hinduísmo, lokapāla refere-se aos Guardiões das Direções e estão associados a oito, nove ou dez direções cardinais. Já no Budismo, ele se refere aos Quatro Reis Celestiais e a outros espíritos protetores, enquanto os Guardiões das Direções são chamados de dikpālas. É possível que Hewitt tenha misturado ambos os contextos em seu ensaio.
[xii] Várias das afirmações neste parágrafo devem ser tomadas com cautela, posto que há uma inconsistência nos Bundahishn hindu e persa acerca dos guardiães celestiais. Hewitt segue a tradição persa que associa Satavaēsa ao sul, enquanto a tradição hindu (e também a escola teosófica) o associa ao oeste. Ademais, apenas os guardiões do norte (Ursa Maior) e do leste (Sírius) são apontados no Avesta, não havendo identificação clara entre as demais constelações e os guardiões.
[xiii] Trecho da estrofe XLVIII do poema The Witch of Atlas de Percy Bysshe Shelley. Em tradução livre: “(…) como um prado que nenhuma foice podou, / Que chuva nunca poderia dobrar ou agitar / Com as constelações da Antártida pavimentadas, / Canopo e sua tripulação, jaz o lago Austral”.
[xiv] Tradução livre a partir da tradução do texto grego ao inglês feita por Robert Brown Jr., quotada por Allen: “The slackened rudder has been placed beneath / The hind-feet of the Dog”. Compare com a tradução de A. W. & G. R. Mair, de 1921: “Loosed is her Rudder and is set beneath the hind feet of the Dog, as he runs in front”.
[xv] Trecho da estela funerária de Tutmés III, quotada por Heinrich Karl Brugsch (apud Brown Jr., 1883, Eridanus: river and constellation, Londres: Longmans, Green & Co., p. 14).
[xvi] Brown Jr., 1899, Researches into the origin of the primitive constellations of the Greeks, Phoenicians and Babylonians, vol. 1, (Oxford: Williams and Norgate), pg. 103.
[xvii] O Anwār-e sohayli, comumente conhecido como Kalilah and Damnah, foi traduzido ao Inglês em 1877, publicado com o nome Anwar-i-Suhaili: Lights of Canopus. Trata-se de um conjunto de fábulas persas compiladas pelo mulá Kamāl-al-din Ḥosayn Wāʿeẓ Kāšefi.
[xviii] “Versos da Second Evening, no poema Evenings in Greece, de Thomas Moore. No original: “A camel slept — young as if wean'd / When last the star Canopus rose”. Em The Poetical Works of Thomas Moore, há uma nota sobre esses versos atribuída a Richardson: “The Arabian shepherd has a peculiar ceremony in weaning the young camel: when the proper time arrives, he turns the camel toward the rising star, Canopus, and says, 'Do you see Canopus? from this moment you taste not another drop of milk'”.
[xix] Trecho de poema declamado à Parte 7 do Lalla Rookh de Thomas Moore. Em tradução livre: “A Estrela do Egito, cuja luz altiva / Nunca irradiou sobre aqueles que descansam / Nas Brancas Ilhas do Oeste”.
[xx] Allen adicionou neste trecho uma nota de rodapé com a seguinte informação: “(...) Zinge, a large village forty miles northeast of Mosul, in Kurdistan, and not far from Kazwin”, embora eu não tenha encontrado nenhuma localidade com esse nome em 40 milhas a nordeste de Mosul. Suponho que Allen tomou-a por Zanjan, uma cidade do atual Irã, situada não muito distante de Qazvin. Como a própria Qazvin (Kazwin) se situa a 383 milhas de Mosul, não há como a informação de Allen acerca da posição de Zinge estar correta. Sua confusão pode dever-se ao comentário de Thomas Moore em sua Poetical Works: “The inhabitants of this country (Zinge) are never afflicted with sadness or melancholy; on this subject the Sheikh Abu-al-Kheir-Azhari has the following distich:
“Who is the man without care or sorrow (tell) that
I may rub my hand to him.
“(Behold) the Zingians, without care or sorrow,
frolicksome, with tipsiness and mirth.”
The philosophers have discovered that the cause of this cheerfulness proceeds from the influence of the star Soheil or Canopus, which rises over them every night.—Extract from a geographical Persian Manuscript, called Heft Aklin, or the Seven Climates, translated by W. Ouseley, Esq.
”. A fonte persa mencionada por Moore deve ter feito Allen procurar a cidade nessa região. Outra pista que aponta a confusão foi que Moore se referiu a um país (country), enquanto Allen buscou identificá-lo a uma vila (village). Todavia, em The Flowers of Persian Literature, by S. Rousseau, encontramos à página 84 uma descrição desta localidade na África: “Geographical Account of Zinj or Ethiopia, from هفت اقليم, or The Seven Climates, translated by W. Ouseley”. Zinge (or Zinj), modernamente Zanj, é como as fontes chinesas e persas à costa oriental da África.
[xxi] Também conhecido como Ptolomeu I Sóter.
[xxii] Allen transcreve este nome como Ḥasīl, que parece significar “lagarta-gafanhoto” em Hebraico. Por outro lado, Emil G. Hirsch, em Jewish Encyclopedia, no verbete Constellations, confirma a informação sobre a associação de Canopus a este termo feita por comentaristas judeus do período medieval, mas transcreve-o como Kesil.
[xxiii] O patriarca em questão parece ser Jó. Lewis G. Lery (1913, in Syria: The Land of Lebanon, Nova Iorque: McBride, Nast & Co., pg. 78) informa sobre uma antiga tradição cristã na Síria que associa Hauran à “Terra de Uz” na qual vivera o patriarca Jó.
[xxiv] Excerto dos versos 89-90 do Canto VIII, do Purgatório, na Divina Comédia de Dante. Allen usou a tradução inglesa de Longfellow. A tradução apresentada é de José Pedro Xavier Pinheiro. No original, em italiano: “A quelle tre facelle / di che 'l polo di qua tutto quanto arde”.
[xxv] Trechos dos verso 145-146 do poema A Dream of Fair Women de Alfred Tennyson. No original, Cleópatra comenta sobre sua vida no Egito: “We drank the Lybian Sun to sleep, and lit / lamps which outburn’d Canopus”.
[xxvi] Esta afirmação deve ser tomada com cautela, posto que não há evidência confiável de que Eta Carinae foi observada ou registrada em cartas celestes antes do século XVII. Antes disso, um provável registro parece ter sido feito por Pieter Kaiser que anotou uma estrela de 4.a magnitude na posição aproximada de onde Eta Carinae se encontra, e esta foi copiada para outros globos feitos à época. O primeiro registro confirmado foi feito por Halley, que a designou com uma das estrelas de sua constelação desusada Robur Carolinum.
[xxvii] Esse nome parece não ter tido uso generalizado, pois é desconhecido nos dias atuais. Uma referência a ele pode ser encontrada em “Some Continued Observations on the Variable Star η Argus, and the Surrounding Nebula”, nota de pesquisa lida por F. Abbott na Royal Society of Tasmania: Towards the centre of the nebula, and close to the star η, an opening of a lengthened and rounded form is noticed, which leaves in view the dark ground of the sky. This has been named by Mr. Abbott, a careful observer, ‘the Crooked Billet.’. Considerando o aspecto visual da nebulosa, é provável que essa região seja o centro daquela chamada de Keyhole, anos depois, por Emma Converse.
[xxviii] Reeves associou erroneamente Tiān Jì à estrela ψ Velorum, e Allen propagou o erro, usando a transliteração Tseen Ke, a qual em listas modernas também é atribuída (em novo engano) a φ Velorum!

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