porém as que estão sob a Lebre perseguida
são todas muito rarefeitas e se conduzem inominadas. [i]
Fenômenos, de Arato.
COLUMBA
é a constelação da Pomba; que os franceses chamam Colombe; os italianos, Colomba; os espanhóis, Paloma; os alemães, Taube; e os ingleses, Dove. Ela foi criada em 1592 por Petrus Plancius, com o nome de Columba Noachi (Pomba de Noé) e acolhida por outros uranógrafos do século XVII com este ou nomes variantes: Columba Nohae e Columba Noae; daí seu antigo nome em inglês: Noah’s Dove; e em francês: Colombe de Noé. Ao contrário destes, mas de significado similar, Friedrich Houtmann listou-a ainda em 1592 como De Duyve med den Olijftack (a Pomba com o Ramo de Oliveira). Ela se situa ao sul da Lebre, sobre o mesmo meridiano do Cinturão de Órion. Foi composta por estrelas dispersas a sudoeste do Cão Maior, próximo ao Navio — tomado como a Arca de Noé — do qual foi tida como a pomba assistente. Mais recentemente, Ian Ridpath propôs a possibilidade de que a constelação também poderia representar a Pomba que Jasão teria soltado à entrada do Mar Negro para auxiliar a nau Argo a atravessar as Simplégades.
A Pomba, na representação de Hevelius |
Sua história envolveu alguns enganos que perduraram por séculos, pois muitos autores representaram-na em mapas da primeira metade do século XVII, sem necessariamente lhe tratar como constelação individual. Chegou a ser considerada criação de Augustin Royer por ter aparecido formalmente em seu atlas celeste de 1679, mas mesmo a Uranometria de Bayer já a tinha mostrado na prancha do Cão Maior setenta e seis anos antes disso, anotando-a como recentioribus Columba (à recente Pomba). Outros acreditaram que ela fosse um asterismo antigo, sobrevivente aos dias clássicos greco-romanos,[1] como Caesius que sustentou sua antiguidade com base no seguinte trecho do Paedagogus de São Clemente de Alexandria:
Signa sive insignia vestra sint Columba, sive Navis coelestis cursu in coelum tendens sive Lyra Musica, in recordationem Apostoli Piscatoris, [ii]
que traduziu ao latim do original grego, embora erradamente, ao confundir ναῦς οὐριοδρομοῦσα, navio que corre solto ao vento, com navio celeste em seu curso no céu. [iii]
A constelação da Pomba, no planisfério de Coronelli. |
Bartschius incluiu-a em seu Usus Astronomicus; Tycho e Flamsteed ignoraram-na; Hevelius, tal como Bayer, ilustrou-a na posição correta sem lhe tratar como constelação; mas Halley mencionou-a, no mesmo ano da publicação do atlas de Royer, inventariando-lhe dez estrelas; e Gould, dois séculos depois, na Argentina, aumentou este número para dezessete.
Detalhe das pranchas de Ignace de Pardies, onde se vê a proximidade entre a Pomba e o Navio Argo. |
Descrevendo a formação da constelação da Pomba a partir de partes anteriormente atribuídas ao Cão Maior, Smyth aponta que
a parte que foi usurpada desta forma era chamada Muliphein, de al-Muḥlifayn, as duas estrelas confiáveis, porque eram costumeiramente confundidas com Suhayl, ou Canopus, antes da qual elas nasciam: estas duas estrelas são atualmente α e β Columbae. Acredita-se que Muliphein as duas estrelas que são chamadas Ḥaḍār, chão, e al-Wazn, peso. [iv]
Já fizemos referência a al-Muḥlifayn junto às estrelas γ, ζ e λ Argus, δ Canis Majoris e α Centauri.
A constelação da Pomba no mapa do francês de la Hire. |
Na China atual, a constelação recebeu o nome Tiān Gē, a Pomba Celestial.
α, 2.7.
Phact, seu nome oficial, e as variantes Phakt, Phaet e Phad são derivadas do árabe Fākhitah, termo usado para nomear um grupo de aves columbidae, que incluem o Pombo.
Ela era a principal estrela do asterismo chinês Zhàng Rén, o Avô ou Patriarca, que também incluía ε.
Embora inconspícua, Lockyer acreditava que ela fosse importante nos cultos do templos egípcios e regularmente observada em Edfu e Filas desde 6400 aC; mas que foi sucedida por Sirius por volta de 3000 aC, tal como α Ursae Majoris o foi por γ Draconis no Norte. Ele alega ter encontrado três templos em Medinet Habu, adjacentes um ao outro, mas orientados de maneira diferente, aparentemente em direção à posição ocupada por Phact em 2525, 1250 e 900 anos antes de nossa era: todos eles dedicados ao deus Ámon. Ele acreditava que até doze templos diferentes estavam orientados para essa estrela; mas a seleção de um astro tão débil para um propósito tão importante parece duvidosa.
Phact encontra-se a 33° ao sul de ε Orionis, a estrela central do Cinturão.
β, 3.1.
Porta o nome oficial Wazn, de al-Wazn, o Peso. Listas antigas também podem apresentar a variante Wezn, cujo uso deve ser descontinuado.
Juntamente com α fazia parte dos disputados al-Muḥlifayn; e al-Tizīnī adicionalmente chamou ambas de al-ʾAghribah, os Corvos, um título que Hyde atribuiu a um agrupamento no Cão Maior.
O Treatise de Chilmead traz esta breve descrição da Pomba:
11 Starres: of which there are two in the backe of it of the second magnitude, which they call the Good messengers, or bringers of good newes; and those in the right wing are consecrated to the Appeased Deity, and those in the left, to the Retiring of the waters in the time of the Deluge. [v]
Na China, β, γ e λ faziam parte do asterismo Zǐ, o Filho.
Heis situou α e β nas costas da ave; υ2 na asa direita, e ε na esquerda.
ε, 5.0, é Elkurud, seu nome oficial por decisão do Working Group on Star Names da União Astronômica Internacional em 2016. Deriva-se do árabe al-Qurūd, os Símios, título proposto inicialmente por Ideler para explicar, via erro de transcrição, a denominação al-Furūd (a Solitária) mencionada por al-Ṣūfī para o asterismo do qual ε fazia parte. [vi]
Por outro lado, Qazwīnī não incluiu ε nesse grupo al-Qurūd, mas sim as estrelas θ e κ; as quais na China compunham o asterismo Sūn, o Neto ou Descendente.
λ, 4.9, por vezes chamada Tsze, nome não oficial proveniente de uma transliteração antiquada de Zǐ (o Filho), o asterismo chinês que também inclui β e λ .
μ, 5.2, era conhecida na China como Shǐ, o Excremento.
Notas de Rodapé (do texto original)
[1] O fraco brilho desta constelação atesta contra a probabilidade dessa hipótese, e implicaria que outro grupo estelar, mais conspícuo, devesse ser conhecido como a Pomba, possivelmente a Cabeleira de Berenice. [Nota do Tradutor: Allen lança essa hipótese por não saber sobre o erro cometido por Caesius na tradução do Paedagogus.]
Notas Explicativas da Tradução
[i] Excerto dos vv. 384-385, dos Fenômenos de Arato, na tradução de C. Leonardo B. Antunes (in Arato, Fenômenos. Cadernos de Tradução, 38, jan-jun, 2016, org. Bacarat Jr., J. C., Porto Alegre: Instituto de Letras da UFRGS). Allen usou a tradução versificada por Brown Jr.: “Others underneath the hunted Hare, / All very dim and nameless roll along.”. No original grego: “τὰ δ᾽ ἔνερθε διωκομένοιο Λαγωοῦ / πάντα μάλ᾽ ἠερόεντα καὶ οὐκ ὀνομαστὰ φέρονται”.
[ii] Em tradução aproximada: “Sejam suas insígnias a Pomba, ou o Navio celeste em seu curso no céu, ou a Lira, em recordação ao Apóstolo Pescador”. A menção à Lira e ao Navio Celeste como insígnias dão a entender que a Pomba também era uma constelação. Veja, contudo, a nota abaixo.
[iii] O trecho traduzido por Caesius corresponde à uma parte editada do Livro 3, Cap. XI, parágrafo 59 do Paedagogus de São Clemente de Alexandria que trata sobre a permissão ao uso de anéis ornamentais por cristãos. No original grego: “Αἱ δὲ σφραγῖδες ἡμῖν ἔστων πελειὰς ἢ ἰχθὺς ἢ ναῦς οὐριοδρομοῦσα ἢ λύρα μουσική, ᾗ κέχρηται Πολυκράτης, ἢ ἄγκυρα ναυτική, ἣν Σέλευκος ἐνεχαράττετο τῇ γλυφῇ, κἂν ἁλιεύων τις ᾖ, ἀποστόλου μεμνήσεται καὶ τῶν ἐξ ὕδατος ἀνασπωμένων παιδίων· οὐ γὰρ εἰδώλων πρόσωπα ἐναποτυπωτέον, οἷς καὶ τὸ προσέχειν ἀπείρηται, οὐδὲ μὴν ξίφος ἢ τόξον τοῖς”. Compare com a tradução ao inglês feita por William Wilson: “And let our seals be either a dove, or a fish, or a ship scudding before the wind, or a musical lyre, which Polycrates used, or a ship's anchor, which Seleucus got engraved as a device; and if there be one fishing, he will remember the apostle, and the children drawn out of the water” (E que nossas insígnias sejam uma pomba, ou um peixe, ou um navio correndo diante do vento, ou uma lira musical usada por Polícrates, ou a âncora de um navio, que Seleuco gravou como um distintivo; e se houver uma pescaria, ele se lembrará do apóstolo e das crianças tiradas da água).
[iv] Citação a Smyth, W. H. 1844, A Cycle of Celestial Objects, Londres: John W. Parker, pg. 168. A afirmação de que as estrelas α e β Columbae pudessem ser confundidas com Canopus soa demasiadamente estranha, considerando a diferença de brilho entre elas. A frase original de Smyth se baseia em Ideler e contém mais informações, que Allen deixou de lado na citação, que tentam esclarecer um tanto mais essa suposta confusão: “The part thus usurped was called Muliphein, from al-muhlefeïn, the two stars sworn by, because they were often mistaken for Soheïl, or Canopus, before which they rise: these two stars are now α e β Columbae. Muliphein is recognised as comprehending the two stars called Ḥaḍár, ground, and al-wezn, weight, astonishing sidereal names, says Ideler, of which the Arabians were ignorant of the proper location, for while some placed them to the two bright stars in the Dove, others stuck them in the fore-foot of the Centaur, and a third party assigned them to ζ, λ, and γ in Argo”. Isto é, Ideler sustenta que os arábios não sabiam exatamente onde ficava al-Muḥlifayn e atribuíam o nome a vários pares de estrelas que nasciam antes de Canopus, inclusive a α e β Columbae.
[v] Em tradução aproximada: “11 estrelas: das quais há duas na parte de trás, de segunda magnitude, que chamam de Bons Mensageiros, ou portadores de boas novas; aquelas da asa direita são consagrados à Divindade Apaziguada, e as da esquerda, à Baixa das águas no tempo do Dilúvio”. In Chilmead, J. 1659, A Learned Treatise of Globes, pg. 117.
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